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Conteúdos falsos dizem que governo concedeu essas terras por meio de acordo com companhia brasileira que atua no segmento de soluções ambientais. Conteúdos nas redes dizem que governo cedeu 14% do território à empresa privada
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Circulam nas redes sociais vídeos que acusam o governo brasileiro de entregar a administração de territórios indígenas à Ambipar, multinacional brasileira que atua no segmento de soluções ambientais. É #FAKE.
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Nesta reportagem, leia sobre cinco tópicos:
O que dizem as publicações falsas
Fato ou Fake: checagem passo a passo
O que diz a Ambipar
O que dizem o Ministério dos Povos Indígenas e a Secom
Especialista fala sobre licitação em terras indígenas
O que dizem as publicações falsas
🛑 Quando apareceram os conteúdos mentirosos? Logo após a assinatura de um acordo preliminar entre o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e a multinacional brasileira Ambipar, em 26 de janeiro de 2025, começaram a circular vídeos no TikTok e no Instagram, além de postagens no Facebook e no X.
🚫 O que afirmam esses posts? Veja abaixo dois exemplos.
“Lula entrega 14% do território nacional na mão de uma empresa privada. Uma área do tamanho da Inglaterra e da França, de território indígena, que vai ficar na mão de uma empresa privada. O que os índios acham disso? Vamos obedecer a uma empresa dentro da sua própria terra? Já entregou-se grande parte do país na mão da China, e agora 14% do território nacional na mão dessa empresa privada…”, diz uma postagem de 26 de janeiro de 2025 no Facebook.
“Governo Lula entrega 14% do território nacional para ser gerido por uma multinacional. Estão de um território indígena para a multinacional Ambipar sem nenhum processo de licitação. Essa decisão levanta sérias questões: Quem realmente se beneficia? Onde está a transparência? Mais uma vez, a mídia tradicional segue omissa para proteger o Governo Lula da opinião popular”, diz um conteúdo publicado no TikTok em 31 de janeiro de 2025.
⚠️ Por que o conteúdo é falso?
A concessão da administração de qualquer território indígena do Brasil é vetada tanto pela Constituição e quanto pela Organização Internacional de Trabalho (OIT).
Questionada pelo Fato ou Fake, a Ambipar negou ser beneficiária de qualquer transferência de territórios indígenas pelo poder público. A empresa diz ser juridicamente impossível que um instrumento como um protocolo de intenções conceda qualquer tipo de controle sobre terras indígenas.
Em uma nota divulgada em 26 de janeiro em seu site com o título “Fake News sobre parceria firmada pelo Ministério dos Povos Indígenas”, o MPI afirmou que a alegação “além de falsa, não tem qualquer respaldo jurídico”.
A Secom, por sua vez, informou que a parceria “não implica transferências de verbas públicas ou de responsabilidades do Estado”. Em um comunicado de 27 de janeiro com o título “Governo Federal não está transferindo gestão de terras indígenas para iniciativa privada”, a pasta reforça que esse tipo de acordo não depende de licitações.
📝 O que o acordo prevê, de fato? Trata-se de um protocolo de intenções voltado a emergências climáticas e ações de sustentabilidade que pode abarcar 1 milhão de quilômetros quadrados em terras indígenas brasileiras, o que corresponde 14% do território do país. Ele não prevê a possibilidade de transferência de recursos entre os envolvidos. O plano tem os seguintes objetivos, entre outros:
“Desenvolver projetos para conservação e recuperação ambiental.”
“Oferecer suporte técnico às comunidades originárias, com vistas à prevenção e resposta a eventos climáticos extremos.”
“Promover a economia circular e o gerenciamento de resíduos ambientais.”
Fato ou Fake: checagem passo a passo
▶️ Para checar as acusações contra o protocolo, o Fato ou Fake inicialmente verificou se a transferência de terras indígenas teria amparo constitucional. A resposta é não.
▶️ Professor de direito da PUC-SP e especialista em questões indígenas, Álvaro Luiz Travassos de Azevedo Gonzaga lembra que o Artigo 231 da Constituição Federal de 1988 expressa vetos para a ocupação, domínio e exploração dos territórios demarcados. Veja o que dizem os parágrafos quarto e sexto da Carta Magna:
“§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos
§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar”.
▶️ Gonzaga explica que nenhuma política pública sobre territórios indígenas pode entrar em vigor sem consulta prévia às comunidades. Ou seja, o governo federal — seja via MPI ou Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) — não tem prerrogativa legal de transferir a posse ou a administração dessas áreas a um ente privado.
▶️ O professor observa que as relações econômicas e de trabalho dentro de territórios indígenas são amparadas pela Convenção n° 169 da OIT, ratificada pelo Brasil em 2002. Entre os pontos citados na cartilha, há destaque para o primeiro item do Artigo 7:
Os povos interessados deverão ter o direito de escolher suas próprias prioridades no que diz respeito ao processo de desenvolvimento, na medida em que ele afete as suas vidas, crenças, instituições e bem-estar espiritual, bem como as terras que ocupam ou utilizam de alguma forma, e de controlar, na medida do possível, o seu próprio desenvolvimento econômico, social e cultural. Além disso, esses povos deverão participar da formulação, aplicação e avaliação dos planos e programas de desenvolvimento nacional e regional suscetíveis de afetá-Ios diretamente.
▶️ Gonzaga explica que, em caso de transgressão do tratado, o Brasil sofreria sanções e poderia ser julgado em tribunais internacionais.
“A transferência dos territórios indígenas para um ente privado seria inconstitucional, inconvencional e uma anormalidade jurídica”, categoriza o docente.
▶️ O Fato ou Fake também procurou a Articulação de Povos Indígenas (Apib) para falar sobre o assunto. O coordenador executivo da organização, Kleber Karipuna, afirmou que recebeu informações sobre o acordo entre o MPI e a Ambipar, mas evitou fazer juízos de valor sobre a parceria:
“A informação que o ministério nos passou é justamente de um protocolo de intenções, e ainda precisa de muitos esclarecimentos sobre como vai se implementar na prática um plano de trabalho. [Nós, da Apib] vamos continuar acompanhando para garantir que os direitos territoriais dos indígenas continuem sob a responsabilidade dos próprios povos que lá vivem”.
O que diz a Ambipar
▶️ De acordo com a Ambipar, a atuação prevista pelo protocolo deve ocorrer “exclusivamente no contexto de cooperação técnica, respeitando integralmente a legislação vigente e o direito ao consentimento livre, prévio e informado das comunidades envolvidas, em conformidade com a Convenção n° 169 da OIT”.
▶️ Nesse sentido, a empresa complementa afirmando que “qualquer atuação depende exclusivamente da aprovação dos povos indígenas, e caso nenhuma comunidade aceite a implementação de ações derivadas do protocolo, ele perderia automaticamente seu objeto [o propósito]”.
▶️ Perguntada sobre como custearia a operação, a Ambipar informou que o protocolo assinado representa o início do diálogo e que futuros passos da parceria ainda serão discutidos com o MPI.
O que dizem o Ministério dos Povos Indígenas e a Secom
▶️ Notas publicadas nos dia 26 e 27 de janeiro pelo MPI e pela Secom, respectivamente, desmentem a informação da concessão de 14% do território brasileiro, salientando que essa manobra não teria respaldo jurídico e que os territórios são “inalienáveis e indisponíveis”.
Licitação em terras indígenas
▶️ Sobre a dispensa do processo de licitação, o professor Álvaro Luiz Travassos de Azevedo Gonzaga explica que não há, de fato, necessidade de uma licitação para que um protocolo de intenções seja assinado.
▶️ Além disso, o docente diz que existem regras específicas para que povos e territórios indígenas possam contratar serviços, sem que sejam seguidas as mesmas formalidades licitatórias exigidas de outros poderes e entes públicos.
▶️ Nesse contexto, o regulamento da Funai que trata de ações voltadas aos povos indígenas dispensa licitação para a contratação de serviços em determinadas situações, especialmente nas áreas de saúde, educação e infraestrutura.
Isso porque essas áreas são vistas como essenciais para a manutenção e desenvolvimento dessas comunidades, e a simplificação de processos visa garantir agilidade na execução de projetos.
Conteúdos nas redes dizem que governo cedeu 14% do território à empresa privada
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