Voto pelos correios EUA: como o método norte-americano é usado

O método tem mais de um século de vida e faz parte, tradicionalmente, do contexto eleitoral dos Estados Unidos. O voto pelos correios EUA é uma opção consolidada. Entretanto, soa diferente para o público brasileiro e também alimenta um debate acalorado no pleito deste ano no país norte-americano.

A eleição de 2020, no cenário da pandemia da Covid-19, registrou o recorde de votos pelos correios EUA e foi alvo de questionamentos por parte de Donald Trump. O republicano está novamente na corrida presidencial e divide os holofotes com a democrata Kamala Harris.

A candidata democrata defende a expansão da votação por correios. Na visão de Kamala, é uma forma de possibilitar que os cidadãos possam votar. Nos Estados Unidos, o voto é facultativo.

Voto pelos correios EUA: método teve expansão no cenário da pandemia

Voto pelos correios EUA: método é tradicional | Foto: Getty Images/ND

Já Trump vem criticando a alternativa, gerando controvérsias sobre o voto pelos correios EUA. Embora não tenha evidência, o ex-presidente bate na tecla que a opção é mais suscetível a fraudes, o que comprometeria a lisura do processo eleitoral.

Voto pelos correios EUA: histórico e legislação

O voto pelos correios é algo tradicional nos Estados Unidos, uma opção de mais de um século. Na Guerra de Secessão (entre 1861 e 1865), na segunda metade do século XIX, os militares usaram tal alternativa pela primeira vez. O modelo, então, foi ampliado e funciona até os dias de hoje.

Nos Estados Unidos, cada estado decide as regras eleitorais. Lá, não existe um Tribunal Superior Eleitoral (TSE), órgão que concentra as decisões e padroniza o sistema eleitoral do Brasil. Desta forma, o voto pelos correios EUA também pode variar de estado para estado norte-americano. Por exemplo, um determinado estado pode exigir justificativa para o voto pelo correio, enquanto outro libera a opção livremente.

Em 2020, no contexto da pandemia, a opção de votar pelo correio ganhou ainda mais importância. Assim, atingiu números expressivos. Segundo o site “US Elections Project”, mais de 65 milhões de norte-americanos votaram por correspondência. A modalidade foi a escolha de 40% do eleitorado que votou, um total de 159 milhões de norte-americanos.

Voto pelos correios EUA: sistema pode ter regras diferentes em cada estado

Voto pelos correios EUA: sistema conta com protocolos de segurança eficientes | Foto: Getty Images/ND

Na pandemia, alguns estados decidiram manter a votação 100% por correio, enquanto outros aumentaram a possibilidade e também criaram condições para a modalidade – como estar doente ou estudar fora do domicílio eleitoral.

A eleição antecipada também foi difundida no país em 2020. É a opção em que os eleitores podem votar, presencialmente ou por correspondência, antes do dia marcado da eleição. A modalidade também depende das regras de cada estado.

Funcionamento do voto pelos correios EUA

A data da eleição dos Estados Unidos em 2024 é no dia 5 de novembro. Contudo, o pleito já começou nas urnas. Minnesota, Dakota do Sul e Virgínia foram os três primeiros estados que liberaram votação presencial antecipada, no dia 20 de setembro.

A depender do estado, a votação antecipada também se dá pelo correio. Apenas dois estados (Alabama e New Hampshire) não oferecem essa modalidade de antecipar o voto.

A votação antecipada presencial é uma alternativa também para não sobrecarregar o Serviço Postal dos EUA e evitar erros comuns que acabam anulando o voto por correspondência, além de contornar possíveis problemas de logística, como, por exemplo, entrega e transporte.

As regras do voto pelos correios EUA variam de estado para estado. Califórnia e Nevada, por exemplo, enviam as cédulas para todos os eleitores registrados, enquanto em outros locais o eleitor precisa solicitar o recebimento da cédula. O preenchimento incorreto da cédula, rasura, assinatura inválida ou entrega fora do prazo levam à anulação do voto. São erros comuns que acontecem e provocam a rejeição da cédula.

A restrição de ter de apresentar uma justificativa válida para votar por correio de voto ausente vigora em estados como Texas, Carolina do Sul e Indiana.

O Serviço Postal, uma empresa estatal, é responsável pela logística da votação pelo correio. O eleitor deve preencher a cédula e postar no correio.

A apuração do voto pelos correios EUA acontece em duas etapas. A primeira é a autenticação da cédula, em que o órgão estadual verifica se a assinatura é compatível com a do documento de eleitor. Se autenticada, a cédula vai para a contagem, a segunda etapa.

Voto pelos correios EUA: Kamala é defensora do método

Kamala Harris defende expansão do voto pelos correios EUA – Foto: Site da campanha / Divulgação

A contagem do voto pelos correios EUA pode ocorrer no recebimento da cédula ou a partir de uma data específica. A regra varia de acordo com o estado. Tem estado, por exemplo, que só permite que a contagem seja iniciada no dia da eleição, o que explica o fato de o resultado demorar a ser divulgado. Isso porque o anúncio do resultado da votação por correio é feito com a apuração dos votos presenciais.

A eleição deste ano, por sinal, já teve polêmica. Aliados de Donald Trump conseguiram aprovar uma nova regra no estado da Geórgia em que os votos deverão ser contados à mão. Assim, essa medida deve atrasar a divulgação do resultado no local.

Voto pelos correios EUA: Trump ataca o método desde 2020

Donald Trump costuma atacar o voto pelos correios EUA – Foto: X/ Reprodução/ ND

A tabulação dos votos por meio de máquinas de leitura óptica é a mais recorrente na maioria dos estados norte-americanos. Agora, a Geórgia vai utilizar dois métodos. Primeiramente, os votos serão lidos pelo equipamento. A segunda etapa será a contagem manual, em que três funcionários de cada seção eleitoral vão abrir as caixas de votos no dia 5 de novembro ou no dia seguinte para fazer a contagem.

Segundo dados do “Verified Voting”, cerca de 70% do eleitorado norte-americano vota em uma cédula de papel preenchida à mão, enquanto cerca de 5% do eleitorado utiliza o método eletrônico. Já 25% usa uma máquina que gera um voto impresso, mas o dado não é armazenado eletronicamente.

As cédulas de papel (enviadas pelos correios ou preenchidas à mão ou a que conta com auxílio da máquina) são contabilizadas, na maioria dos casos, com o recurso da leitura óptica de uma máquina.

Controvérsias e polêmica do voto pelos correios EUA

Em 2020, ano em que perdeu a eleição para o democrata Joe Biden, Donald Trump questionou, sem provas, o voto pelos correios EUA e pôs em xeque o método, com a acusação de que a opção seria mais suscetível à fraude.

Trump, inclusive, entrou com ações judiciais sobre a votação em alguns estados e pediu recontagem de votos em Wisconsin. Ele aumentou o tom das acusações no começo da apuração, no contexto que apontava que perderia para Biden.

– Se você contar os votos legais, eu ganho facilmente. Se você contar os votos ilegais, eles roubam a eleição de nós – declarou Trump, em 2020, apontando que os votos pelos correios seriam ilegais. Ele até se declarou vencedor do pleito.

A “cruzada” de Trump contra o resultado da eleição de 2020 se tornou um problema para o ex-presidente. Em 2023, ele foi acusado de conspirar contra os Estados Unidos por tentar mudar o resultado das urnas.

Procurador-especial do Tribunal Distrital Federal de Washington, Jack Smith apresentou a acusação contra Trump por conspirar para fraudar os Estados Unidos, tentar obstruir um processo oficial e conspirar para privar os eleitores dos direitos civis. O ex-presidente nega ter cometido irregularidades.

Ele também enfrenta problemas na Geórgia. Trump também foi acusado de conspiração para reverter a derrota para Biden em 2020. A investigação começou após o vazamento de uma ligação do ex-presidente para Brad Raffensperger, secretário de Estado da Geórgia, pedindo para ele “encontrar 11.780 votos”. O ex-presidente declarou ser inocente.

O discurso de Trump não conseguiu deslegitimar o voto pelos correios EUA. O método é confiável, com protocolos de segurança, como códigos únicos, verificação de assinatura e número da previdência social.

Voto pelos correios EUA x urnas eletrônicas do Brasil

O voto pelos correios EUA difere bem do modelo brasileiro, em que a votação é feita em urna eletrônica, adotada no Brasil em 1996 e implementada totalmente em 2000. O aparelho nasceu com o objetivo de eliminar possibilidades de fraudes e limitar a intervenção humana no processo de voto.

Urna eletrônica do Brasil tem grande diferença em relação ao voto pelos correios EUA – Foto: Moises Stuker/NDTV

A urna eletrônica garante a segurança da votação, com tecnologia de ponta que assegura a confiabilidade. A máquina não tem conexão com internet ou Bluetooth, por exemplo, e conta com um sistema de criptografia, assinatura e resumos digitais que aumentam o nível de proteção. A urna é testada frequentemente e não se tem registros de violações.

A apuração das urnas eletrônicas é uma grande diferença em relação ao modelo norte-americano. No Brasil, o resultado é divulgado com uma rapidez muito maior em comparação com os Estados Unidos, fruto da tecnologia. A urna emite um boletim, com a apuração dos votos de cada seção.

O voto pelos correios EUA

A tradição norte-americana se mantém intacta, com segurança do voto nos EUA, para participar do processo democrático que significa uma eleição. A polarização do pleito presidencial e os desdobramentos da postura de Trump em relação a 2020 influenciam o debate sobre o tema. A pauta, assim, continua quente e faz parte do contexto político atual.

Desta forma, o voto pelos correios EUA representa mais que um método do sistema eleitoral dos Estados Unidos: é “pano de fundo” para divergência de visões políticas e estratégias de campanha. As eleições EUA 2024 estão a todo vapor e o dia 5 de novembro está cada vez mais próximo.

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