Está nas mãos da Justiça definir se a NGI Sul, empresa que opera o ferry boat de Itajaí e Navegantes, deve ou não pagar um valor milionário, referente ao ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Segundo a administração da empresa, durante décadas, a operação foi isenta e, em 2023, um fiscal da Fazenda do Estado autuou a empresa e determinou o pagamento.
A NGI contesta a cobrança, questiona o congelamento da tarifa aos usuários desde 2017 e isenções concedidas por lei a grupos específicos, que recaem sobre a empresa e diminuem a margem de lucro. Compelido pelo Tribunal de Contas a lançar uma nova licitação para o ferry boat de Itajaí, o Estado, por meio da Secretaria de Infraestrutura, informou que não há previsão para isso, e que é uma construção complexa.
Administrador do ferry boat de Itajaí e Navegantes defende isenção do ICMS
Administrador da NGI Sul, Paulo Weidle contesta a cobrança de R$ 21,7 milhões, considerando juros e multas. “Não fazemos traslado de mercadoria ou serviço. Carregamos passageiros, então, temos a isenção”, diz Weidle.
“Tenho a lei mostrando que a empresa é isenta, como em inúmeras fiscalizações fomos considerados. Tenho documento da Secretaria de Fazenda informando que a empresa faz transporte de passageiros, e que é isenta”, completa.
Ainda não há uma sentença determinando que a empresa deve pagar o tributo, porém, teve que deixar bens como garantia. “Para argumentar se sou devedor, ou não, primeiro, tenho que garantir o valor do bem discutido, deixando depositado em juízo o valor para, no final, se condenado, pagar”, explica Weidle.
A NGI, então, colocou as embarcações do ferry boat de Itajaí à disposição da Justiça. O valor é de R$ 30 milhões, acima do estipulado. Na autuação, segundo o empresário, foi considerada também a lei do passe livre: “Quem mora em Navegantes e trabalha em Itajaí e vice-versa ganha do Estado um ticket para atravessar. Estão tributando ICMS em cima disso”. Weidle considera a cobrança absurda.
O jornal ND obteve documento que mostra o que é cobrado da empresa. Numa delas, de R$ 15,9 milhões, a infração é porque a NGI teria deixado de submeter operações tributáveis à incidência do ICMS: “deixar de submeter totalmente prestação tributável, escrituradas em documentos fiscais, à incidência do ICMS, constatado através da apuração de que o contribuinte declara como isentas prestações que estão sujeitas à alíquota de 12% e alíquota de 17%”.
Na outra, de R$ 5,8 milhões, teria deixado de “submeter parcialmente operações de transporte aquaviário, escrituradas em documentos fiscais, à incidência do ICMS. O contribuinte utilizou, indevidamente, alíquota menor do que o devido (12%) em relação às prestações sujeitas à alíquota de 17%.”
Congelamento da tarifa e cortes na operação
A tarifa cobrada no ferry boat de Itajaí é definida pelo Estado, por meio da Secretaria de Infraestrutura, está congelada desde 2017 e, conforme o empresário, o Estado nunca inseriu valores referentes ao ICMS na cobrança.
Weidle sustenta que insumos, como diesel, chapa de ferro, óleo lubrificante e tinta para embarcarcação subiram de preço e que a empresa opera fora da realidade da inflação. “Hoje, basicamente, sobrevivemos de empréstimo e aplicação, não da tarifa. Situação complexa, porque o Estado fica nessa de se vai ter ou não licitação e não me dá a tarifa necessária”, critica o administrador.
O congelamento da tarifa tende a impactar mais o serviço. Se hoje há reclamações dos usuários, com relação ao atendimento de alguns funcionários no ferry boat de Itajaí, em breve, o reflexo pode ser na oferta de horários: “estou em via de travar o turno da madrugada, que é deficitário. Eu pago para atravessar os usuários. Na travessia do bairro, vou ter que eliminar o turno do domingo, também deficitário. Em setembro, completa sete anos do último reajuste da empresa.”
Segundo Weidle, a NGI solicitou inúmeros reajustes e a resposta do Estado é que não existe um novo contrato licitado – o que, agora, depende do próprio Estado.
O empresário também questiona a legislação que dá gratuidade a diversos grupos de pessoas, como pessoas com deficiência, autistas, pessoas em tratamento de câncer, hemodiálise e fibromialgia, porém, segundo ele, o Estado não reembolsa a empresa por isso e 100% do custeio desta operação é bancado pela empresa que administra o ferry boat de Itajaí.
Procurada, a Secretaria de Infraestrutura informou que a tarifa está congelada, porque não há instrumento jurídico válido, considerando que uma sentença judicial anulou as autorizações que a empresa tinha junto ao extinto Deter (Departamento de Transportes e Terminais). Também argumentou que as isenções do passe-livre não recaem sobre a NGI e que o Estado faz o repasse mensal do passe-livre para a empresa.
Quanto ao lançamento da licitação, o prazo é de dois anos, a partir do TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado com o MPSC (Ministério Público de Santa Catarina). “O Estado tem todo o interesse em resolver o mais rapidamente possível. Trata-se, contudo, de um processo muito complexo, que envolve vários entes públicos, e que não pode ser elaborado de qualquer maneira, às pressas.”
Ainda conforme a Secretaria, técnicos da pasta, da SCPar e da Fazenda têm feito reuniões semanais sobre a atualização do EVTEA (Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental de rodovias) contratado pela Infraestrutura e que o processo está em avançado estágio de análise.
Tarifa cobrada por tipo de usuário no ferry boat de Itajaí e Navegantes:
- Pedestre: R$ 1,45
- Bicicleta R$ 1,85
- Moto R$ 2,30
- Carro: R$ 9,05
Bilhetagem eletrônica ainda em 2024
Embarcações novas e bilhetagem eletrônica até o fim do ano são melhorias implementadas pela NGI no ferry boat de Itajaí. Para efetivar o sistema de bilhetagem, desde agosto de 2021, a NGI tem contrato com a Solaris. “Não efetivou até hoje, porque dentro desse sistema, tenho que incluir o programa passe livre. Essa dinâmica passou pelo crivo do Estado, de estabelecer o que pode, o que não pode e foi modificado o sistema para o Estado receber o que entende necessário para a confirmação do passe”, afirma o administrador da NGI.
Como será exigido, também, reconhecimento facial, Weidle acredita que o número de usuários do ferry boat de Itajaí e Navegantes vai cair. “Hoje em dia, a pessoa recebe 50 passes e dá para família, vende. Com reconhecimento facial, só a pessoa vai poder utilizar”, diz.
Weidle lembra ainda que o Estado pode colocar limitações, como permitir que o trabalhador só passe no horário de trabalho. “Isso não está definido, mas está aberto para o Estado escolher e todas essas modificações causaram atrasos de tempo. Estamos no final, então, está perto de ser implementada a bilhetagem eletrônica”. Com a mudança, os usuários poderão pagar em dinheiro e Pix, como já acontece hoje, também por meio de aplicativo, e cartão recarregável.
Em relação às embarcações, o número subiu de quatro para sete. Além disso, as menores foram ampliadas. “Outra alteração é que [no embarque], hoje, o ciclista fica junto com a motociclista e, com a efetivação da bilhetagem eletrônica, vamos colocar com o pedestre, para dar mais comodidade”, afirma Weidle.
A medida também visa reduzir impactos da operação no trânsito, nos horários de pico. Mesmo apontando uma série de dificuldades na operação, atualmente, a NGI pretende participar do futuro certame para seguir operando o ferry boat de Itajaí e Navegantes.